Análise - TP6
O papel do/a professor/a no erro
“Os erros são parte importante da nossa experiência. Se não os conhecermos, em breve podemos vir a repeti-los. (...) Basicamente não há nada de errado em cometer erros. Porém, tornar impossível a sua correção é insanidade pura.” (Rubem Alves, A gestação do futuro, p.82).
Nos processos de ação-reflexão-ação ou do movimento de passagem da ação para a conceituação, isto é, das atividades interpessoais para as atividades intrapessoais, o/a professor/a deve saber que, sem a mediação dos erros, esses processos não acontecem ou não teriam sentido.
É pela mediação dos erros que ocorre o processo vital de equilibração majorante. A equilibração por regulação se faz por tentativas e erros e por correção de erros. A equilibração por coordenação de esquemas ocorre justamente porque houve erros na tentativa de assimilar por meio de um único esquema. Igualmente, a equilibração por compensação se baseia nos erros e nas faltas.
De uma forma geral, para tratar com os erros, o/a professor/a deve “partir dos conhecimentos que os/as alunos/as já possuem, ou seja, de seus sistemas de significações; apresentar problemas que geram conflitos cognitivos; dar ênfase à maximização do desenvolvimento e não apenas à busca de resultados, centrando-se no processo de construção de conhecimento; aceitar soluções ‘erradas’ como pertinentes, desde que inovadoras de programas na atividade cognitiva; fazer com que os/as alunos/as tomem consciência dos erros cometidos, percebendo-os como problemas a serem enfrentados, sem que se lhes imponham caminhos previamente traçados.“ (Davis e Espósito, “Papel e função do erro na avaliação escolar,” in Cadernos de Pesquisa, n. 74, 1990, p. 73).
O papel mediador
O que é?
A criança, pré-adolescente ou adolescente, é um ser que adquire conhecimento utilizando a mediação do próprio objeto do saber, do livro, das revistas, dos meios de comunicação de massa, dos/das colegas de classe, do/a professor/a e de outras pessoas. A aprendizagem é sempre mediada.
O objeto de conhecimento é sempre cultural e histórico e sua manifestação ocorre na sociedade. Assim, os símbolos e signos/palavras que representam os objetos são os autênticos mediadores do conhecimento. Os mediadores são elos entre o sujeito e o objeto, funcionam como uma espécie de filtro através do qual o sujeito é capaz de ver o mundo e operar sobre ele.
Mediação é o elo entre o sujeito e o objeto de aprendizagem, é um processo que possibilita a assimilação, acomodação e organização do sujeito.
Como funciona?
Essa mediação não funciona com autoritarismo, com imposição de conhecimentos, como no diretivismo pedagógico. Não também por omissão de quem fica “em cima do muro,” como no espontaneísmo pedagógico, na atitude de laissez-faire, de que “espera, para ver como é que fica.” a mediação participa do processo de construção do conhecimento, sem, contudo, desviar nem desvirtuar nada.
A mediação funciona como catalisador químico que, presente numa reação, facilita ou acelera e até mesmo possibilita essa reação. Ausente, retarda a reação ou esta pode até não ocorrer. Como mediador, o/a professor/a não se perde no processo, mas acelera e até possibilita a aprendizagem, respeitando a natureza do sujeito e do objeto e, principalmente, do processo de construção de conhecimentos.
Há muitas formas de o/a professor/a mediar a construção de conhecimentos dos/as alunos/as.
Uma delas é a possibilidade de mediar o “movimento” de passagem do plano A – de ação sobre o objeto – para o plano B – de reflexionamento e de reflexão sobre os fatos tomados do plano anterior. A mediação do/a professor/a se faz justamente no intervalo entre a etapa de construção de conhecimento pelo aluno/a e a etapa de possível produção de um saber enriquecido, complementado.
Outra importante função mediadora que o/a professor/a desempenha é trabalhar com o ambiente e a experiência dos/as alunos/as. Ele dispõe ou ordena os elementos do meio (recursos materiais e humanos), colocando-os em atividades, fazendo “com que os objetos ajam e reajam uns sobre os outros, respeitando a sua própria natureza e, assim, sem qualquer interferência direta no processo, realiza as intenções da razão.” (Vygotsky, formação social da mente, p.61). Consideramos esta a mais nobre função mediadora do/a professor/a: conseguir que os/as alunos/as cheguem à construção de conhecimentos através da interferência no ambiente, dispondo elementos e atividades.
Para que serve?
A mediação é um dos grandes conceitos de Vygotsky. Esse conceito foi elaborado no contexto sócio-histórico, portanto, da crítica dialética. A sua aplicação na educação chega num momento muito oportuno.
O funcionamento da mediação se dá da seguinte maneira: o objeto de aprendizagem, que sempre é cultural, faz o seu desvelamento na teia de relações sociais; através delas, o/a aluno/a entra em interação com o objeto de conhecimento, juntamente com os/as colegas e o/a professor/a. Além da mediação do/a professor e dos/as colegas, se destaca, a mediação da palavra:
-Indica ou mostra o objeto, quando ele está presente, nomeando-o e definindo-o; é a função indexical;
-Substitui o objeto, na sua ausência, desempenhando a função simbólica de representação, de “estar no lugar de...”
Oralidade, escrita e letramento
Alguns dos parâmetros pertinentes entre fala e escrita são as suas diferenças físicas, situacionais e funcionais, que determinam a natureza estrutural das duas modalidades.
No que diz respeito ao aspecto físico, podemos considerar que a fala acontece por meio de representação sonora ao longo de um período de tempo e é percebida pelo ouvido. Os interlocutores podem, baseados nessa característica física, fundamentar suas informações em todo o contexto interativo que se constrói durante a interlocução, utilizando-se de elementos extralingüísticos, por exemplo. A fala é realizada ainda de forma não-permanente. O interlocutor/a precisa acompanhar o ritmo do falante e nem sempre o consegue completamente.
Já a escrita é representada por marcas em um espaço. É uma atividade percebida pela visão, possuindo, ainda, maior durabilidade e exigindo maior precisão que a fala, pois há a necessidade de que as indicações para a boa compreensão do texto baseiem-se unicamente na expressão escrita. Nesse sentido, o/a interlocutor/a é relativamente livre para desenvolver o processo de leitura/escrita com rapidez que deseja.
A fala exibe alta redundância, pois possui pouco tempo para seu planejamento e é, geralmente, espontânea, sendo (re)estruturada no momento de sua emissão. Já a escrita possui baixa redundância, chegando ao/à leitor/a como um objeto acabado.
Quanto ao aspecto situacional, a fala pode ser considerada uma construção conjunta e, não se baseia unicamente em elementos lingüísticos. Por sua vez, a escrita é uma atividade solitária, proporcionando um tempo maior para elaboração e sustentando-se em elementos lingüísticos.
Além disso, em termos funcionais, podemos pensar que enquanto a fala é utilizada mais em contatos sociais, a escrita serve ao trabalho intelectual, pois serve tanto para o registro como para o estoque de informações.
É importante desenvolver na escola um trabalho de produção de texto que valorize a criança, seu contexto e a própria situação de produção. O processo criativo de produção vai emergir da própria interação verbal instaurada na participação ativa entre escola e comunidade.
A postura do/a professor/a não é corrigir o oral espontâneo da criança/adolescente, mas mostrar-lhe a outra possibilidade de uso. Não se trata de substituir um padrão pelo outro, mas de ensiná-la a conhecer as diferenças nos planos fonético, sintático e lexical entre as duas variantes – a sua, a coloquial, e a oferecida como modelo pelo/a professor/a. E a partir do material lingüístico espontâneo, verificar quais são os aspectos lingüísticos que devem receber maior atenção.
A oralidade precisa ser estimulada e aprimorada, pois servirá de substrato para a aquisição e desenvolvimento da escrita.
Outro aspecto que merece a atenção do/a professor/a é o de cuidar para não se transformar num interlocutor/a imposto/a, a quem o/a aluno/a se sente na obrigação de dirigir seu texto; a criança deve saber que está escrevendo para alguém, mas esse interlocutor deve colocar-se no processo de forma natural e não imposta.
Pelo mesmo motivo – o de não criar uma situação artificial e inibidora do processo de elaboração – o/a professor/a deve também ter o cuidado de não fazer proposta de produção escrita como instrumento de avaliação. É preciso encarar essa produção escrita como um trabalho pessoal que merece ser observado e avaliado em relação ao próprio desempenho do/a estudante. Onde ele/ela mesma, com o auxílio do/a professor/a, procura aprimorar o seu próprio texto.
É preciso ter em conta que pela experiência lingüística e na interação pela linguagem, na consciência das diferentes formas do discurso comunicativo e sua representação é que chegamos à análise da parte, enquanto expressão da totalidade da interação lingüística significativa socialmente.
As aprendizagens nas quais se compartilham significados não privilegiam a apreensão mecânica do saber, mas a apreensão das relações nele impressas. A tarefa de conhecer através da língua escrita, ao contemplar o pensar por relações, amplia as possibilidades mentais de lidar com a palavra – enquanto signo gráfico - representativa da realidade. Então, a aprendizagem deixa de ser estéril para ganhar a vida presente na “não palavra,” ou seja, na própria realidade.
Ler e escrever não são somente “ferramentas” de acesso ao saber sistematizado. São aprendizagens e exercícios de aproximação dos processos mentais que asseguram uma relação teórica com a realidade objetiva, porque os conteúdos escolares são representações de sistemas de conceitos historicamente determinados. Nesse sentido, ler e escrever não podem ser um ato mecânico de combinação de sons e signos gráficos.
No mundo das relações, os significados não substituem mecanicamente os significantes. É por isso que se compreende que ler e escrever não são meras decodificações, nas quais se estabelece uma correspondência entre o dado sensorial (o estímulo visual, escrito) com seu substituto fonêmico, combinando-os para construir uma palavra; não se trata, portanto, de uma simples conversão grafo-fonológica, no caso da leitura.
Considerar que a palavra escrita simboliza algo, e que representar o símbolo falado com signos que o registrem graficamente requer a ação de processos mentais complexos, ainda mais porque a linguagem oral contém dados semânticos que são culturais e que conferem à palavra significados sociais.
Compete à escola não só o repasse e socialização do saber, mas a socialização das formas mais elaboradas em termos de atividade mental que garantem a apropriação do conhecimento. Ao/à professor/a, caberá o compromisso de sua inserção como membro efetivo do grupo, organicamente vinculado ao ato de conhecer, sem dissociar a fala do escrever, isto é, conferindo à linguagem oral não o papel autoritário e estéril, mas o de instrumento coletivo de aprendizagem.
REFERÊNCIAS
1. BIANCHETTI, Lucídio (org.) Trama & texto. Leitura crítica. Leitura criativa. São Paulo: Plexus, 2006.
2. FERREIRO, Emilia e TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da língua escrita. Trad. Diana Myriam Lichtenstein, Liana Di Marco e Mário Corso. Porto Alegre: Artes Médicas, 2006.
3. JANTSCH, Ari Paulo, BIANCHETTI, Lucídio (org.) Interdisciplinaridade: para além da filosofia do sujeito. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.
4. MATENCIO, M. de L. Meirelles. Leitura, produção de textos e a escola: reflexões sobre o processo de letramento. São Paulo: Mercado de Letras, 2004. (Coleção Letramento, Educação e Sociedade)
5. MATUI, Jiron. Construtivismo: teoria construtiva sócio-histórica aplicada ao ensino. São Paulo: Moderna, 1995.
6. PÉCORA, Alcir. Problemas de redação. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
7. PIAGET, Jean. A linguagem e o pensamento da criança. Trad. Manuel Campos. Rio de Janeiro: Fundos de Cultura, 1961.
sábado, 22 de agosto de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário